terça-feira, 2 de abril de 2013

Musa: a Dourada pt I




Entre as pedras antergas, entre os ecos da cervenzas… 
das correntes claras e primeiras… 
morou Musa - a dos OLHOS CLAROS…



Terra da terra, vida da vida…
rocha pura que o tempo anima… 
e transforma… 
em asas de brisa… 
em guardiã da memória… 
em ancestral…



Ela deu forma ao vento e às árvores despertas que tudo nos dizem…
segredando desde longe o ECO do Mundo, 
sintonia da ETERNA VIDA que a todos conduz …


Na voz profunda e imponente das águas do grande mar…
 que se esbatem em vagas antigas, 
contando as histórias das gerações eclipsadas, 
dormentes baixo suas eternas vagas:


ondas amigas para o todo o que com elas fala…



Florestas vedadas… 
onde o coração do mundo palpita sem pausa, medo, ou segredo: 
exposto o SER para qualquer ser que se recorde de sê-lo…




Musa suspira… 
sobre a alta Montanha o seu coração treme… 
desanima…



Pois tudo o que conhece periga… 
se esvaindo como a suave melodia… 
entre o tumulto de uma praga…



No vale o barulho se estende… 
o clamor do ferro se sente… 
os berros sem pauta desgarram a pedra, 
a árvore, a criatura pequena e a grande montanha… 
tudo isto: 

por nada



Uma praga…

Os seres homem declinam 
– “cor” os chamavam os da língua antiga -
os da pura chama que o tempo anima;


Inversão da sintonia… 
deixaram de procurar e embelezar a vida 
– que todos são e que a todos anima…


Separados estes… 
destrutivos na sua dor… 
afastam todos os que comungam da vida 
e do seu eterno primor…



Os tempos são de singela cautela… 
de aceitar a fria quimera 
– que já sucedeu e que de novo regressa, 
para um novo ciclo de ardor… 



refinamento… 
renascimento… 


é o tempo do crepúsculo que antecede a noite escura
 para aqueles em cujo coração já mais não habita o A(MORS).



Assim:



Os guardiães se retiram…
para o mundo dos sonhos…
as veredas antigas –
onde nenhum do ruído poderá alguma vez penetrar…



Esse é o caminho do meio,
a porta estreita pela que apenas podem entrar:
os que sabem a via e a sua sintonia…
aqueles que vêm e vão e sabem sempre regressar…
 para sempre recordando – no seu ser ecoando:



o SER MAIOR que lhes dá lugar;



“Este é o mundo do ruído, o mundo do ser perdido…
Elkor já não se manifesta aqui
– aqueles perderam o rumo e assim vagam –
 destruindo o mundo, a vida e a floresta

– perseguindo a CHAMA procurando a CHAMA controlar”



Mas – que fazer?!

Reclama, ela que é a última dos grandes seres,
que encarnam a rocha, a água, a vida, a terra… 
a CHAMA e o seu QUERER:



“Nada querida, nada…” 
diz a sacerdotisa da rocha e da fraga...


e o guardião das árvores e das correntes viventes
 que da montanha resvalam,
assente com calma 
e suspira em lento ademão…



“É o plano das eras… 
é o tempo no que as chuvas lavarão o que antes era…
no que as pedras calarão em silêncio
os ecos que outrora cantaram…
e no que seres criança, perdidos da mão
 – vagarão pelo mundo procurando a sua casa… 
– perseverando –
a encontrarão.”



Mas, algo em seu ser se agita, algo por dentro com viva voz grita:

 – NÃO!

não há mais saída?...



Todo o amor e primor de eras de devoção:
 ferido, insultado, destruído
por seres máquina que mordem a montanha,
rasgam os véus da floresta,
conspurcam a viva água…
sem mais…
sem coração…



El-Kor…
como contemplar esta via…
sem erguer a chama da vida em defesa da própria vida 
que assim se fez e assim declina e se desfaz:



Por opção… 
se ergue o dragão na sua enigmática via…
a de dar à luz a sua própria cria,
devorando na sua eterna chama a luz da escuridão…



“Musa: querida
– é tempo de partir,
de aceitar a via e seguir…
virtude e sua causa original…



lembra:
se te ergues, se adormeces
– serás como eles –
lá em baixo: sem esperança…
mais uma sombra sem graça..
um espectro lamentando,
uma voz sem rosto
a tua sina ecoando



A Guardiã não entendia…
e o pastor das árvores,
num relance
– entreviu a triste sina,


desta que estava destinada a ser a última
da estirpe dos alvos entes que a o mundo velaram,
que suas chamas a rocha modelaram,
cujo olhar deu origem e ser
aos ramos de virtude que pelo mundo se pôde plantar…
até que se abriu o grande ovo…


e do Nordeste surgiu outro povo:
rude, frio…
sem pertença a este lugar…



Com eles trouxeram o ruído
e a violência
e as máquinas da mente
para o mundo dominar…



Um a um, 
os guardiães foram esmorecendo…
sua voz se esvaindo no tempo…
latir da vida ecoando 
cada vez mais longe de nós…


E os humanos…
os que seriam nascidos
depois de que o mundo estivesse sarado
– nasceram no meio da grande oclusão –


na que ferro e fogo se encontraram
em embate pelo sentido do destino que todos partilhamos
– pela vida que em nós late
– filhos irmanados de um ser só…



Os do nordeste
– frios e mirrados –
entre os homens misturados –
neles cruzados e entrelaçados:
pelas suas frias artes geminados
– assim se não puderam rejeitar:



Sendo assim meio humanos
 ficando entre humanos disfarçados,
a natura os não podia debelar…


Começava a era do espanto,
o tempo do negro pranto…


onde os guardiães se ficavam
– contemplando ao longe as obras macabras –
de mãos, vontade e esperança atadas…



pois os filhos da luz não mais poderiam ajudar…



El-Kor se finava.. 
entre os berros dos que ainda lutavam… 
e os urros de triunfo destes 
que nada respeitavam 
a não ser a comum vontade de ter… 



PODER;



E os guardiães calaram… 
sua voz deixaram… 
entre as pedras, as árvores… 
e o grande mar…